A transformação digital tem revolucionado o agronegócio brasileiro, impulsionando o setor rumo a uma nova era marcada por automação, conectividade e inteligência de dados. Com o avanço da chamada Agricultura 4.0, propriedades rurais têm adotado tecnologias, como sensores de solo, drones, softwares de gestão agrícola, inteligência artificial e dispositivos de Internet das Coisas (IoT), para otimizar processos, reduzir custos e tomar decisões mais estratégicas. Esse movimento tem dado origem às chamadas “fazendas inteligentes”. São operações agrícolas altamente tecnológicas. E capazes de monitorar em tempo real cada etapa da produção, desde o preparo do solo até a colheita e a logística de distribuição.
Ao permitir o monitoramento preciso de variáveis, como clima, umidade do solo, desempenho de máquinas e ocorrência de pragas, a Agricultura 4.0 melhora significativamente a produtividade e a sustentabilidade da atividade agropecuária. Dados coletados por sensores são analisados por algoritmos de inteligência artificial que sugerem ações para antecipar riscos e aumentar os rendimentos. Máquinas autônomas realizam tarefas com maior precisão, e os gestores conseguem visualizar todas as operações da fazenda em painéis integrados na nuvem. No entanto, toda essa digitalização também acarreta um novo desafio silencioso, mas crítico: ameaças digitais.

Com o aumento da conectividade no campo, o agronegócio passou a lidar com grandes volumes de dados sensíveis, como informações sobre safras, contratos comerciais, estoques, logística e dados financeiros. Ativos digitais que hoje se tornaram alvos valiosos para criminosos cibernéticos, e os ataques virtuais têm se tornado cada vez mais frequentes e sofisticados. Sistemas de irrigação automatizada, softwares de gestão de fazendas e plataformas de exportação podem ser“invadidos”, paralisando operações inteiras e gerando prejuízos milionários.
Ataques ao setor
Nos últimos anos, o Brasil assistiu a casos reais de ciberataques contra importantes nomes do setor. Em 2023, um grande produtor agrícola do Mato Grosso, teve suas operações afetadas por um ataque de ransomware que paralisou sistemas logísticos e de produção. A suspeita recai sobre uma variante do grupo criminoso LockBit, conhecido por ataques complexos e pedidos de resgate milionários. No ano seguinte, uma multinacional sofreu um vazamento de dados internos, supostamente obtidos por acesso indevido a seus sistemas corporativos. Documentos estratégicos e informações de compliance teriam sido expostos em fóruns da dark web. Já uma tradicional cooperativa enfrentou, também em 2023, um incidente que afetou os serviços digitais oferecidos a seus cooperados. A origem do ataque foi a exploração de vulnerabilidades em servidores mal protegidos, o que gerou a interrupção de sistemas e exigiu um esforço manual de recuperação.
Esses episódios ilustram como a nova era da cibersegurança, se não acompanhada de medidas adequadas de proteção, pode representar uma ameaça para o próprio funcionamento do agronegócio. Muitos produtores, principalmente de pequeno e médio porte, ainda não possuem políticas estruturadas de segurança da informação, o que os torna alvos fáceis para ataques virtuais. Em um setor que movimenta bilhões e tem papel vital na segurança alimentar do país e do mundo, a fragilidade digital pode ter efeitos profundos e duradouros.
Mudança de mentalidade e cibersegurança
Por isso, proteger o ambiente digital das fazendas inteligentes exige mais do que ferramentas técnicas; requer uma mudança de mentalidade. É preciso investir em firewalls, backups periódicos, autenticação de múltiplos fatores e atualizações constantes de sistemas. Mas, sobretudo, é necessário promover a capacitação das equipes. Criando uma cultura de segurança digital que envolva todos os níveis da operação, desde os gestores até os colaboradores no campo. A proteção contra ameaças cibernéticas deve ser encarada com a mesma seriedade que se dedica à escolha de sementes, à manutenção de máquinas ou ao planejamento de uma safra.
A Agricultura 4.0 veio para ficar e seu potencial de transformação é imenso, tornando o agro mais eficiente, sustentável e competitivo. No entanto, para que esse futuro digital se concretize plenamente, o setor precisa encarar a cibersegurança como mais um pilar estratégico. As fazendas do futuro já estão conectadas, agora, precisam estar também protegidas.
*Marcelo Branquinho é CEO e fundador da TI Safe, uma empresa especializada em segurança cibernética para infraestruturas críticas. Graduado em Engenharia Elétrica, especialista em segurança de sistemas SCADA e membro da International Society of Automation (ISA).
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