O agronegócio brasileiro vive um novo momento. Mais do que produtividade e escala — atributos historicamente associados ao setor —, a nova fronteira da competitividade passa pela capacidade de utilizar dados de forma inteligente. A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) projeta um crescimento de 7,4% no VBP do agronegócio, totalizando uma receita de R$ 1,43 trilhão até o final de 2025. O segmento agrícola deve alcançar R$ 937,55 bilhões, enquanto o valor bruto da produção pecuária deve crescer 9,2%, chegando a R$ 495,13 bilhões.
Os investimentos no setor reforçam essa tendência: R$25,6 bilhões devem ser aplicados em soluções tecnológicas no campo no próximo ano, um aumento de 21% em relação a 2024, segundo projeções da CNA em parceria com o CEPEA-USP. Desse total, cerca de 45% será direcionado a tecnologia de coleta e análise de dados, integração de plataformas e aplicação de inteligência artificial (IA) nas operações agrícolas.
O agronegócio brasileiro já se destaca globalmente pela produtividade e pela escala. Mas o próximo salto competitivo está diretamente ligado à capacidade de transformar dados em decisões mais rápidas e precisas através do uso da Inteligência Artificial.
Além disso, o mercado global de IoT agrícola, por exemplo, deve atingir US$ 20,9 bilhões, impulsionado pela demanda por maior eficiência e sustentabilidade, conforme dados da McKinsey. No Brasil, a conectividade no campo já é tendência consolidada, mas o custo ainda limita a adoção em larga escala.
Impactos reais no campo
A aplicação dessas tecnologias vai além da teoria: ela já gera resultados concretos. Um estudo da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ/USP), publicado em fevereiro de 2025, aponta que a digitalização nas lavouras monitoradas resultou em um aumento médio de 18,7% na produtividade, além de reduzir em 12,3% o consumo de insumos agrícolas, como fertilizantes e defensivos.
O mesmo levantamento mostra que propriedades com alto grau de digitalização apresentam rentabilidade 23% superior em relação àquelas que operam com modelos tradicionais de gestão. Os produtores estão conseguindo reduzir o uso de insumos e, ao mesmo tempo, aumentar o desempenho das lavouras. Isso se traduz em operações mais sustentáveis, rentáveis e resilientes.
Uma abordagem integrada: antes, dentro e depois da porteira
A verdadeira inovação no agronegócio moderno reside na compreensão de que a digitalização deve abranger toda a cadeia produtiva, não apenas as operações no campo. Essa visão sistêmica divide-se em três frentes principais:
- Antes da porteira: nesta etapa, o foco está na digitalização de processos que antecedem a produção, incluindo o desenvolvimento de cultivares com auxílio de inteligência artificial, planejamento estratégico de safras e otimização da cadeia de suprimentos de insumos.
- Dentro da porteira: no campo propriamente dito, as tecnologias incluem centros de operações agrícolas (COA), monitoramento de máquinas com telemetria, modelos preditivos para aplicação precisa de insumos e sistemas de visão computacional para detecção precoce de pragas e doenças.
- Depois da porteira: esta fase engloba a agroindústria, logística, distribuição e varejo, com soluções como plataformas de e-commerce especializadas, otimização de rotas de transporte, previsão de demanda utilizando machine learning e gestão inteligente de estoques.
Hoje, é fundamental enxergar o agronegócio como um ecossistema integrado. Não adianta digitalizar apenas uma etapa do processo produtivo se as outras continuarem desconectadas. A transformação precisa ser sistêmica para gerar eficiência real. Por isso, é importante contar com clientes e parceiros, principalmente antes e depois da porteira, que levam as melhores soluções em tecnologia aos produtores rurais.
Casos de sucesso demonstram o potencial da tecnologia
Entre os exemplos que confirmam o potencial dessas inovações está a Tereos, uma das maiores produtoras de açúcar e etanol do país. A empresa implementou um Centro de Operações Agroindustriais (COA) para unificar as áreas agrícola e industrial, com apoio da Keyrus, multinacional líder em consultoria de inteligência de dados e transformação de negócios. A estimativa é de economizar R$25 milhões por ano com a iniciativa.
Na Cooperativa Agroindustrial Holambra, a Keyrus apoiou o desenvolvimento de uma plataforma digital voltada à interação com cooperados. O projeto fortaleceu o relacionamento com os produtores e modernizou o acesso a informações sobre produção, crédito e compras de insumos.
Além disso, um dos cases mais avançados envolveu a criação de um sistema de IA generativa voltado à área jurídica de uma grande empresa do setor. Utilizando modelos de linguagem treinados com documentos legais da companhia, a solução permite buscas e consultas automatizadas a contratos complexos, aumentando a produtividade da equipe e reduzindo riscos.
Outro caso emblemático é o de uma grande companhia do setor que enfrentava gargalos na gestão de contratos com fornecedores. A solução envolveu a implementação de um pipeline automatizado de dados — um fluxo digital para organizar e processar informações — combinado com o uso de modelos de linguagem natural (LLMs), semelhantes ao ChatGPT, adaptados ao vocabulário jurídico da empresa. O sistema permite consultas conversacionais instantâneas a documentos complexos, economizando horas de trabalho manual.
Essa transformação na gestão contratual mostra como a inteligência artificial pode ser aplicada em frentes diversas — de tarefas simples, como um assistente virtual, até sistemas avançados capazes de analisar imagens em tempo real para detectar pragas no campo.
Perspectivas e desafios até 2030
Segundo uma pesquisa da McKinsey & Company, divulgada em abril de 2025, o mercado brasileiro de tecnologias agrícolas deve movimentar R$ 42 bilhões até 2030. Apesar dos avanços, a digitalização no campo ainda esbarra em gargalos importantes, sendo o principal deles a conectividade em áreas remotas. Infelizmente, ainda existem produtores com sensores de última geração, mas sem sinal de internet estável, fazendo com que a entrega do valor pleno da tecnologia trave.
No entanto, para contornar as limitações, será necessário adotar soluções que funcionem parcialmente offline, sincronizando dados assim que o sinal retorna. Outro ponto de atenção é a maturidade digital das equipes. Mais do que tecnologia, é preciso formar profissionais capazes de interpretá-la, por isso, as organizações precisarão investir em treinamentos, programas de capacitação e soluções com interfaces intuitivas, porque a transformação digital também é uma transformação humana.
A margem para decisões baseadas apenas na intuição ou na experiência está diminuindo. Entramos em uma era em que a capacidade analítica definirá o sucesso ou o fracasso das operações agrícolas. E isso vale para pequenos, médios e grandes empresas do agronegócio.

*Por Rodrigo Cruz é Vice-presidente de Estratégia de Crescimento e Inovação de Portfólio da Keyrus no Brasil
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