Pedidos no setor atingem 389 casos no primeiro trimestre, enquanto inadimplência rural alcança 7,9% e produtores recorrem à monetização de ativos judiciais
Foto: Tony Oliveira/Sistema CNA/Senar

O agronegócio brasileiro enfrenta uma transformação profunda na forma de lidar com o endividamento. Dados do primeiro trimestre de 2025 revelam que os pedidos de recuperação judicial (RJ) no setor atingiram 389 casos, representando um aumento de 44,6% em relação ao mesmo período de 2024 e de 21,5% na comparação com o último trimestre do ano anterior.

CONTINUA APÓS A PUBLICIDADE

A inadimplência da população rural chegou a 7,9% no início do ano, sinalizando um cenário de pressão financeira crescente. O movimento indica que a recuperação judicial deixou de ser apenas um recurso emergencial e passou a integrar o planejamento estratégico de produtores e empresas do agro.

Produtores pessoa física lideram alta nos pedidos

Entre os destaques, os produtores rurais pessoa física registraram 195 solicitações de RJ no primeiro trimestre de 2025, um salto de 39,2% sobre o trimestre anterior e de 83,9% em comparação com os 106 pedidos do mesmo período de 2024.

Matheus Matos, Sócio e Diretor Jurídico da MA7 Negócios

Esse grupo inclui principalmente arrendatários e produtores sem posse formal da terra, considerados mais vulneráveis devido à dificuldade de acesso a crédito e margens operacionais reduzidas.

Já os produtores pessoa jurídica contabilizaram 113 solicitações no período, ante 110 no trimestre anterior e 86 no mesmo intervalo de 2024, representando crescimento anual de 31%. As empresas da cadeia agroindustrial somaram 81 pedidos entre janeiro e março, número 15,7% superior ao trimestre anterior e 5,1% acima de um ano antes.

CONTINUA APÓS A PUBLICIDADE

Judicialização vira ferramenta de sobrevivência

Além das recuperações judiciais, o número de ações revisionais e execuções contra produtores rurais cresceu mais de 20% no último ano. Em âmbito nacional, as RJs aumentaram mais de 30% nos últimos 12 meses, consolidando a judicialização como parte do cotidiano empresarial.

“Estamos vendo produtores recorrerem ao Judiciário como ferramenta para ganhar tempo e preservar a operação. Isso não é sinal de fragilidade apenas, mas de adaptação a um sistema de crédito que deixou de atender à realidade do campo”, analisa Matheus Matos, sócio da MA7 Negócios.

O movimento reflete um ambiente financeiro marcado por custos crescentes, juros elevados e restrição bancária, levando agricultores a buscar renegociação e fôlego de caixa através dos tribunais.

Monetização de ativos judiciais ganha força

Diante das dificuldades de acesso a capital de giro, cresce a monetização de ativos judiciais no agronegócio. Créditos tributários, indenizações e processos judiciais estão sendo convertidos em liquidez imediata para produtores que enfrentam queda de receita.

O mercado de créditos judiciais, que já movimenta bilhões de reais no Brasil, tornou-se alternativa concreta para manter operações ativas. “Ativos que antes ficavam invisíveis agora viraram fonte de liquidez. Um crédito tributário ou uma ação judicial pode ser convertido em capital para pagar fornecedores, investir em tecnologia e manter o negócio vivo”, explica Matos.

Reinvenção como resposta à crise

Especialistas destacam que, apesar de indicar estresse financeiro, o aumento nas ações judiciais também demonstra a capacidade de adaptação do agronegócio. Com o setor respondendo por quase 30% do PIB brasileiro, a combinação entre judicialização, crédito estruturado e securitização pode redesenhar o financiamento rural.

“O agro está mostrando que consegue se reinventar mesmo sob pressão. O que antes era visto como último recurso agora passa a ser ferramenta estratégica de reequilíbrio financeiro”, avalia o sócio da MA7 Negócios.

O desafio atual é transformar soluções emergenciais em estratégias permanentes. E com isso garantir previsibilidade e sustentabilidade para um dos pilares da economia brasileira em um cenário de incertezas crescentes.