Entre labaredas e silêncios, o documentário Pantanal transformou em imagem e som uma ferida aberta no coração do Brasil. A produção foi indicada ao Wildscreen Panda Awards, conhecido como Oscar Verde, na categoria impacto. A premiação, considerada a mais prestigiada do cinema ambiental, será entregue no dia 22 de outubro, em Bristol, na Inglaterra.
O filme é uma co-produção entre Brasil e Reino Unido, realizada pela ONG Environmental Justice Foundation (EJF), e joga luz sobre uma realidade que muitos insistem em apagar: os incêndios que consumiram a maior planície alagável do planeta entre 2020 e 2024.
Gravado durante um dos períodos mais sombrios da história recente do bioma, o documentário percorre os caminhos secos do Pantanal — outrora rios, agora cinzas. Ele acompanha dois ambientalistas brasileiros que, mesmo diante da devastação, seguem firmes na tentativa de salvar o que ainda pulsa. Assim, o espectador se depara com a beleza em ruínas, onde araras sobrevoam fumaças densas e jacarés agonizam em pântanos transformados em cinzeiros.
Além disso, a produção destaca a força de quem não se rendeu ao fogo. A criação da Brigada Alto Pantanal surge como um sopro de resistência. Formada por ribeirinhos, indígenas, pescadores e voluntários, a brigada atua tanto no enfrentamento às chamas quanto no manejo sustentável do fogo. Trata-se de gente comum, com rostos marcados pelo sol e mãos calejadas, que virou soldado sem farda para proteger a própria terra.
Indicação emociona ambientalistas e leva Pantanal ao cenário global
Por isso, a seleção do documentário entre os finalistas do Oscar Verde foi recebida com emoção por quem viveu a história de dentro. Luciana Leite, representante-chefe da EJF no Brasil e uma das ambientalistas retratadas no filme, acredita que a indicação reforça a importância planetária do ecossistema.
“Desde que pisei no Pantanal pela primeira vez, acreditei que, se as pessoas soubessem o que estava acontecendo, as coisas seriam diferentes. A primeira vez que vim ao Pantanal foi para comemorar meu aniversário de casamento, há cinco anos, e descobri, para meu horror, que este lugar mágico estava sofrendo com incêndios devastadores e recordes”, relembra Luciana.
“Passei meus dias resgatando a vida selvagem e alertando sobre a destruição do Pantanal, bem como sobre o quão especial ele ainda é. Este momento fortuito trouxe um novo propósito à minha vida, e ainda estou aqui hoje.”
Do outro lado do Atlântico, a repercussão também emocionou. Steve Trent, CEO e fundador da EJF, afirma que a indicação consolida o papel do cinema na defesa ambiental.
“Estou muito feliz e honrado que nosso filme seja indicado, juntamente com produções tão fantásticas, a este prestigioso prêmio. Ao mesmo tempo, é exatamente aqui que o Pantanal deveria estar: no cenário mundial, com mais pessoas conhecendo sua beleza estonteante, sua cultura e a necessidade urgente de protegê-lo antes que desapareça”, declarou.
“Quando você assistir ao filme, tenho certeza de que sentirá o mesmo que eu senti quando o vi pela primeira vez, e sempre que o vi desde então: uma sensação de admiração e urgência em defender um dos lugares selvagens mais preciosos e vulneráveis do nosso planeta, e dizer a todos que quiserem ouvir que finalmente chegou a hora de proteger o Pantanal.”
Um registro que denuncia e resiste ao esquecimento
Com narrativa sensível e realista, Pantanal coloca o espectador dentro da mata, entre os estalos dos galhos carbonizados e o voo desesperado dos animais. É uma experiência que arde. Queima. E que, paradoxalmente, aquece a esperança.
Além disso, o documentário denuncia, sem precisar gritar, a ausência do poder público. Mostra a negligência como combustível de uma tragédia anunciada, onde cada hectare queimado é uma página arrancada do futuro.
Em tempos de emergência climática, em que o verde desaparece num piscar de fósforo, o filme surge como símbolo de resistência. É, portanto, um registro necessário de um Brasil profundo, pulsante e ainda possível. Claro, desde que haja vontade política e ação coletiva.
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