Uma pesquisa pioneira da Embrapa Agroindústria de Alimentos em parceria com o Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira (IEAPM) acaba de revolucionar o mercado de proteínas alternativas no Brasil. O estudo resultou na criação de um banco de dados inédito que mapeia as características físicas, químicas e sensoriais de sete espécies de pescado de alto valor comercial no país.

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O levantamento analisou garoupa, robalo, bijupirá, atum bigeye, atum albacora, camarão cinza e salmão-do-atlântico. A coordenadora da pesquisa, Fabíola Fogaça, explica que essas informações são fundamentais para reproduzir pescados à base de plantas (plant-based) ou carne cultivada (cell-based) com máxima fidelidade ao produto fresco.

“O mercado busca alimentos o mais próximo possível do produto in natura. Nossa base de dados fornece o mapa completo para isso”, afirma a pesquisadora.

Da acidez ao aroma: o DNA do pescado revelado

O estudo padronizou a medição de atributos essenciais como pH muscular, perfil de compostos aromáticos voláteis, coloração da carne, microestrutura das fibras e textura. Cada um desses elementos desempenha papel crucial na experiência sensorial do consumidor.

Foto: Fabíola Fogaça/Embrapa

O pH, por exemplo, revela o grau de acidez natural de cada espécie e é fundamental para reproduzir sabor, textura e estabilidade. Já o perfil aromático funciona como uma impressão digital química, formada por moléculas que evaporam facilmente e explicam por que o salmão tem cheiro distinto do robalo ou atum.

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Textura e cor: ciência por trás da percepção

A análise microscópica das fibras musculares revela informações valiosas sobre espessura e espaçamento, características que determinam a sensação na boca. Essa estrutura explica, por exemplo, por que o salmão “desfia” em lascas largas enquanto o camarão apresenta carne mais firme.

Foto: Fabíola Fogaça/Embrapa

A coloração, avaliada tanto no alimento cru quanto cozido, é atributo decisivo na aceitação comercial. Consumidores associam diretamente a cor à qualidade, frescor e até à identificação da espécie.

Dados brasileiros ganham alcance global

Os resultados alimentam duas plataformas internacionais criadas pelo The Good Food Institute (GFI): o PISCES (Phylogenetic Index of Seafood CharactEriStics) e o ATLAS (ArcheType Library for Alternative Seafood). Ambas funcionam como repositórios abertos que aceleram o desenvolvimento e comercialização de alternativas de pescado.

Com a integração dos dados brasileiros, pesquisadores e startups de proteína alternativa em todo o mundo passam a ter acesso facilitado a informações científicas sobre essas espécies, impulsionando a inovação baseada em evidências.

Antes desta pesquisa, não existia um repositório abrangente com dados padronizados sobre diferentes pescados. As informações estavam fragmentadas na literatura científica, obtidas por métodos não comparáveis.

“Aplicamos protocolos uniformes de análise em todas as espécies, gerando resultados de alta qualidade que beneficiam tanto a ciência quanto a indústria”, destaca Fabíola Fogaça.

Impacto no desenvolvimento de produtos

Um levantamento do Good Food Institute de 2020 identificou que aparência, cor e textura são os atributos sensoriais mais importantes a serem reproduzidos. Porém, fatores como pH, microestrutura muscular e compostos voláteis também afetam diretamente a experiência do consumidor.

Com o novo banco de dados, empresas podem desenvolver fórmulas e processos que resultem em alternativas mais realistas, seja usando proteínas vegetais texturizadas ou cultivando células em biorreatores.

Os resultados foram compilados no Catálogo de Caracterização do Pescado Marinho para a Indústria de Proteínas Alternativas, publicado em 2025. O material serve como guia para empresas e startups de biotecnologia interessadas em criar sushis veganos, fishburgers vegetais, salmão cultivado e outras inovações.

“A expectativa é que esses dados impulsionem novas pesquisas e contribuam para levar ao mercado produtos de origem vegetal ou cultivada com qualidade cada vez mais próxima ao pescado tradicional”, conclui a pesquisadora.