Pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) criaram uma solução inovadora para um problema antigo da agricultura: o desperdício de produtos químicos. A nova tecnologia usa microagulhas de seda que injetam nutrientes diretamente nas plantas.
O professor associado Benedetto Marelli lidera a equipe responsável pela descoberta. Os cientistas desenvolveram matrizes de microagulhas capazes de transportar vitaminas, minerais e outros compostos essenciais para o interior dos cultivos.
A pesquisa foi desenvolvida em parceria com a Singapore-MIT Alliance for Research and Technology. O estudo completo saiu na revista Nature Nanotechnology.
Por que a seda funciona melhor
A fibroína de seda oferece características únicas para esta aplicação. O material resiste ao manuseio e se decompõe naturalmente no ambiente. As microagulhas perfuram o caule das plantas sem deixar resíduos permanentes no campo.
Os pesquisadores criam essas ferramentas através de um processo simples. Eles despejam uma mistura salina de seda em moldes cônicos pequenos. Após a evaporação da água, removem o sal e revelam microagulhas ocas prontas para uso.
“Estudantes de pós-graduação produzem milhares de pontas em uma tarde”, explica Doyoon Kim, ex-pós-doutorando do MIT. “O processo não exige sala limpa. Qualquer pessoa pode fazer na própria cozinha.”
As proteínas da seda são gentis com tecidos vivos. Essa característica inicialmente atraiu engenheiros médicos há duas décadas. Eles buscavam desenvolver vacinas indolores através de microagulhas. A mesma delicadeza protege os caules das plantas.
Precisão elimina contaminação ambiental
Pesticidas tradicionais em spray ou pó se espalham pelo vento. Estes produtos também se infiltram no lençol freático. Estudos mostram que a maior parte dos químicos ativos nunca atinge as folhas pretendidas. O resultado é contaminação do solo e do ar.
As microagulhas de seda ficam fixas no sistema vascular da planta. Cada miligrama de produto permanece exatamente onde deve atuar. Essa precisão permite que agricultores usem quantidades muito menores por hectare.
Kim testou a tecnologia em tomateiros com clorose. Ele injetou ferro diretamente nos caules e observou a reversão do amarelecimento. O tratamento durou vários dias porque os núcleos ocos liberam a dose gradualmente.
“Existe uma grande necessidade de tornar a agricultura mais eficiente”, afirma Marelli. A clorose causada por deficiência de ferro pode reduzir a produção de tomate em até 30%.
Vitaminas humanas chegam às plantas
As microagulhas transportam mais do que insumos agrícolas tradicionais. A equipe do MIT carregou vitamina B12 nos caules de tomateiros cultivados em estufa. Essa vitamina normalmente não existe na maioria das plantas.
Testes posteriores confirmaram que a vitamina migrou do caule para o fruto antes da colheita. Essa descoberta abre caminho para biofortificação diretamente na planta. Veganos se beneficiariam especialmente, já que encontram B12 principalmente em alimentos de origem animal.
“Esse mecanismo de entrega abre muitas possibilidades novas”, diz Marelli. Seu laboratório se concentra no desenvolvimento de materiais sustentáveis.
A mesma técnica pode transportar zinco, iodo ou folato. Isso reduziria custos de alimentos fortificados, que hoje recebem tratamento por pulverização ou mistura após a colheita. Pimentas e morangos também se mostram candidatos promissores.
Sistema detecta problemas antes dos sintomas
As microagulhas ocas funcionam em sentido inverso também. Elas podem extrair seiva para análise química detalhada. Durante testes hidropônicos, os pesquisadores detectaram cádmio em tomateiros 15 minutos após a exposição.
Câmeras espectrais atuais só identificam estresse quando as folhas já estão pálidas. A análise da seiva identifica problemas enquanto a planta ainda parece saudável. Alertas precoces permitem correções rápidas e eficazes.
Os pesquisadores monitoraram níveis de cádmio por 18 horas consecutivas. Eles mantiveram as sondas no lugar durante todo o período. Leituras contínuas superam punções manuais, que produtores raramente realizam.
Robôs equipados com sensores adequados poderiam percorrer fileiras inteiras. Eles inseririam microagulhas e transmitiriam dados químicos em tempo real. Essa automação já é comum em estufas de alta tecnologia.
Aplicação em larga escala
Atualmente, estudantes aplicam cada agulha manualmente. Marelli imagina adaptar braços de enxertia automática para o processo. Drones também poderiam cobrir pomares inteiros com eficiência.
“Não deve haver conflito entre agricultura e meio ambiente”, defende o pesquisador. Ele busca ferramentas que aumentem produtividade sem prejudicar a biodiversidade.
Agricultores exigirão comprovação de custo-benefício antes da adoção. Eles também querem garantias de durabilidade durante a colheita. A viabilidade comercial depende da automação e do reabastecimento eficiente de nutrientes.
Testes em campos abertos começam na próxima safra. Os pesquisadores avaliarão custos trabalhistas, resíduos e ganhos de produtividade. Os resultados orientarão estratégias de expansão futuras.
Viabilidade econômica promissora
Casulos de seda já são produzidos em grande escala para suturas cirúrgicas. Isso garante uma cadeia de suprimentos estável. O preço da proteína bruta fica estimado em poucos centavos por agulha.
Os moldes são reutilizáveis indefinidamente. O sal usado no processo pode ser recuperado e reciclado. Esses fatores reduzem significativamente os custos de produção.
Cálculos preliminares indicam retorno rápido do investimento. Estufas poderiam recuperar custos em uma safra com ganho de apenas 5% na produtividade. Testes independentes validarão esses números.
Investidores demonstram interesse crescente na tecnologia. O sistema se integra facilmente a equipamentos agrícolas inteligentes existentes. Negociações iniciais para financiamento já estão em andamento.
Próximos desenvolvimentos
A equipe discute parcerias com empresas de sementes. O objetivo é combinar microagulhas com clipes de mudas. Essa integração uniria nutrição e monitoramento em uma única etapa.
Além da alimentação, estruturas similares podem entregar hormônios a mudas de reflorestamento. Elas também poderiam aplicar vacinas em cultivos ameaçados por vírus.
Pesquisadores em Cingapura avaliam detecção de hormônios em arrozais. Eles estudam plantas afetadas por ondas de calor extremo. Os resultados orientarão sensores para agricultura resiliente ao clima.
Testes em campo confirmarão se os resultados laboratoriais se repetem na prática. Se positivos, tomates do futuro receberão vitaminas através de “canudos” de seda biodegradáveis.
O estudo completo foi publicado na revista científica Nature Nanotechnology.
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