Família Arecaceae supera árvores tradicionais na capacidade de armazenamento hídrico e desempenha papel crucial no ecossistema
Foto: Thaise Emilio/IB-Unesp

As palmeiras amazônicas (Arecaceae) armazenam duas vezes mais água do que árvores dicotiledôneas como ipê, mogno e eucalipto. A descoberta integra um estudo conduzido por pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Rio Claro, vinculado ao Centro de Pesquisa em Biodiversidade e Mudanças Climáticas (CBioClima).

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A professora Thaise Emilio, da Unesp e coordenadora do projeto, apresentou resultados preliminares da pesquisa durante o Fórum Brasil-França “Florestas, Biodiversidade e Sociedades Humanas”, realizado entre 1º e 2 de outubro no auditório da FAPESP. “As palmeiras funcionam como grandes reservatórios ou caixas d’água da floresta”, afirmou a pesquisadora.

Dominância das palmeiras na floresta amazônica

Apesar de representar apenas uma entre 171 famílias de plantas arborescentes na Amazônia, as palmeiras dominam a paisagem florestal tanto no dossel quanto no sub-bosque. Os cientistas levantam a hipótese de que populações humanas antigas domesticaram essas plantas há milhões de anos durante a ocupação e manejo da região.

“Ainda debatemos se os humanos enriqueceram a Amazônia com palmeiras ou se escolheram viver na floresta justamente pela abundância dessas plantas úteis, que possuem grande importância econômica”, explicou Emilio.

Thaise Emílio, professora da Unesp, coordenadora do projeto e pesquisadora associada ao CBioClima: apesar de ser apenas uma entre 171 famílias de plantas arborescentes na Amazônia, as palmeiras são extremamente dominantes na floresta, tanto no dossel como no sub-bosque. Foto: Daniel Antônio/Agência FAPESP

Atualmente, cerca de 75% da produção brasileira de produtos florestais não madeireiros provém de palmeiras. O açaí (Euterpe oleracea) sozinho responde por 50% desse total.

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Capacidade única de retenção hídrica

Desde 2017, Emilio colabora com pesquisadores do Soleil Síncrotron, de Paris, e da Universidade de Bordeaux para analisar a resistência do xilema das palmeiras à embolia induzida pela seca. O xilema constitui o tecido vascular que transporta água e sais minerais das raízes para o restante da planta.

Os cientistas utilizaram o acelerador circular de partículas do Soleil Síncrotron para investigar seis espécies de palmeiras das subfamílias Arecoideae e Coryphoideae. A tecnologia permite examinar a composição e estrutura da matéria em escala molecular.

“Constatamos que as palmeiras apresentam vulnerabilidade à seca similar a outras angiospermas ou gimnospermas. Porém, elas concentram mais água dentro dos troncos e conseguem mobilizar esse recurso, tornando essa a estratégia mais importante para minimizar os riscos de embolia”, detalhou a pesquisadora.

Palmeiras retêm até 70% de água em seus troncos

Pesquisadores da Universidade de Edimburgo, na Escócia, participaram de monitoramentos recentes que revelaram dados surpreendentes. Enquanto árvores dicotiledôneas armazenam no máximo 50% de seu volume em água, as palmeiras retêm até 70%. Durante períodos secos, essas plantas reservam ainda mais água do que nas estações chuvosas.

“Isso gera enormes impactos na biodiversidade da floresta amazônica, que ainda precisamos estimar”, afirmou Emilio.

Durante expedições na floresta em períodos de seca, a equipe observa que apenas as palmeiras produzem frutos. “Só elas dão frutos nessas épocas de seca. Isso mantém a alimentação dos animais e dos humanos que dependem desses recursos. Uma das hipóteses para explicar essa capacidade é justamente o funcionamento diferenciado dessas plantas, que armazenam mais água”, explicou a cientista.

Mudanças climáticas ameaçam serviço ecossistêmico

O serviço ecossistêmico prestado pelas palmeiras enfrenta ameaças devido ao declínio de espécies associadas a climas úmidos. A intensificação do ciclo hidrológico, marcada por secas e estações chuvosas mais extremas, compromete a abundância dessas plantas. “Isso terá um impacto muito importante para a dinâmica da floresta”, alertou Emilio.

Um estudo em andamento avalia através de modelagem o risco de morte de palmeiras em diferentes ambientes e condições climáticas. Os resultados preliminares indicam que essas plantas morrem duas vezes mais do que outras árvores. “A combinação de anos chuvosos e secos está causando uma mudança na dinâmica e nas características de regiões da floresta”, concluiu a pesquisadora.

Cooperação Brasil-França fortalece pesquisas ambientais

O Museu Nacional de História Natural (MNHN) da França, a Universidade de São Paulo (USP) e a FAPESP organizaram o fórum que integrou a Temporada França-Brasil 2025. A programação celebra os 200 anos de relações diplomáticas entre os países.

Marco Antonio Zago, presidente da FAPESP, destacou que a Amazônia Legal ocupa aproximadamente 4 milhões de quilômetros quadrados do Brasil, área equivalente a 40% do tamanho da Europa. A floresta também se estende ao território da Guiana Francesa.

“Brasileiros e franceses compartilham a responsabilidade sobre essa floresta, uma das maiores reservas da biodiversidade do planeta. Portanto, seu destino pode determinar, em grande parte, o destino da humanidade”, avaliou Zago.

O presidente do MNHN, Gilles Bloch, reforçou o compromisso da instituição com as questões ambientais. “Os desafios ambientais compartilhados pela França e pelo Brasil são muito sérios. Este fórum reforça a tradição de colaboração que existe entre nós e a USP”, afirmou.

USP anuncia construção da Praça dos Museus

A vice-reitora da USP, Maria Arminda do Nascimento Arruda, anunciou o projeto de construção da Praça dos Museus da USP, que reunirá acervos dos museus de Zoologia (MZ-USP) e de Arqueologia e Etnologia (MAE-USP).

“A Universidade de São Paulo possui acervos museológicos ímpares e coleções científicas e culturais entre as maiores do mundo. Estamos construindo um novo espaço, com um projeto notável do arquiteto Paulo Mendes da Rocha. Esse novo museu será uma referência para toda a cidade, para o país e para o mundo”, destacou a vice-reitora.

Por Elton Alisson | Agência FAPESP