O Paraná, segundo maior produtor de suínos do Brasil (21,5% do mercado nacional), está escrevendo um novo capítulo na suinocultura: o resgate do Porco Moura, raça crioula com carne comparada a cortes bovinos premium. Com 3.500 animais registrados em 2024 – 74% deles no Estado –, a espécie, quase extinta nos anos 1970, virou símbolo de gastronomia sustentável e alavanca projetos de Indicação Geográfica (IG).
Originário das missões jesuíticas do século XVI, o Porco Moura foi essencial no Brasil colonial: sua banha abastecia lamparinas e cozinhas até ser substituída por óleos vegetais. Com a industrialização, raças europeias de engorda rápida dominaram o mercado, quase extinguindo a Moura. “Em 2014, restavam 625 animais. O Paraná salvou a raça”, afirma Marson Bruck Warpechowski, coordenador do Projeto Porco Moura da UFPR, retomado em 2014 após décadas de esquecimento.
Em 2024, a raça foi declarada Patrimônio Histórico, Cultural e Genético do Paraná, e uma portaria inédita da Adapar regulamenta sua criação em sistema extensivo, garantindo biosseguridade e bem-estar animal.
Carne marmorizada e produção 100% natural: o diferencial
Enquanto suínos industriais atingem o abate em 150 dias, o Moura leva 300 dias, criado solto e alimentado com frutas, tubérculos e pastagens. O resultado é uma carne com:
- Marmoreio superior: Gordura intramuscular que garante maciez e suculência.
- Coloração vermelho intenso: Similar a cortes bovinos como prime rib e T-bone.
- Espessura de toucinho: 3 cm a 5 cm, contra 0,5 cm a 1,5 cm dos industriais.

“Sua adaptação genética ao clima sulista e dieta diversificada criam um terroir único”, destaca Warpechowski. A carne já é vendida em açougues e restaurantes de Curitiba, com rastreabilidade e preços até 30% mais altos que o convencional.
Do abate ao selo de origem
A falta de abatedouros adaptados ainda é um entrave. “Frigoríficos industriais não processam pequenos lotes, encarecendo a logística”, explica Warpechowski. Para viabilizar a cadeia, o Paraná discute a criação de uma marca coletiva e o registro de IG, seguindo o modelo do presunto ibérico espanhol.

Outra frente é a charcutaria gourmet: cortes como ancho steak e bochecha têm atraído chefs e consumidores premium. “Produtos diferenciados agregam valor e justificam o custo”, afirma o professor.
Legislação pioneira e futuro sustentável
A Adapar finaliza a primeira normativa nacional para criação extensiva, com regras claras sobre biosseguridade, espaço por animal e limites para produção de subsistência. “A portaria protege toda a cadeia, inclusive a industrial”, afirma João Humberto Teotônio de Castro, chefe de sanidade suína da agência.
A expectativa é que o texto, publicado em abril de 2024, anteceda a Semana Estadual dos Porcos Crioulos em maio – data que celebra a tradição e impulsiona o mercado.
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