Era agosto de 2024. O Pantanal pegava fogo, mais uma vez. Com a fumaça densa e a vegetação seca, os animais corriam como podiam ou nem isso. Foi nesse cenário que Miranda, uma jovem onça-pintada, apareceu: ferida, exausta e encolhida dentro de uma manilha de concreto, no município de Miranda, em Mato Grosso do Sul.
Estava queimada nas quatro patas. A pele chamuscada. As patas em carne viva. Tinha, na época, pouco mais de dois anos. Jovem demais para morrer daquele jeito. Mas, ao contrário do que parecia, aquela onça ainda não estava pronta para desistir.
O resgate durou 26 horas
Veterinários, bombeiros, biólogos. Gente experiente, acostumada a ver de tudo. Mas o resgate de Miranda foi diferente. A operação começou de madrugada e só terminou no fim da tarde. Foram quase 26 horas de tensão, silêncio e cuidado extremo.
Depois da sedação, veio a corrida contra o tempo. Ela foi levada para o Centro de Recuperação de Animais Silvestres (CRAS), em Campo Grande. Chegou com as patas queimadas até o osso. Ninguém sabia se iria sobreviver.
Tratamento diário, dor e paciência
Durante mais de 40 dias, Miranda foi tratada com tudo o que a medicina veterinária podia oferecer. Curativos todos os dias, pomadas cicatrizantes, sessões de ozonioterapia e muita paciência.

Ela não se rendia. Mesmo com dor, aceitava a comida, reagia aos cuidados e, aos poucos, voltava a caminhar. Cada passo era uma conquista.
Os profissionais evitavam criar expectativas. Mas, no fundo, torciam. E torciam muito.
De volta à mata com um segredo
Quando foi solta de novo no Pantanal, em setembro, Miranda já estava inteira. Havia vencido a fase mais crítica da recuperação. Na ocasião, recebeu um colar com GPS, o que permitiu que fosse monitorada à distância, sem interferências diretas em sua rotina. A partir dali, retomou sua liberdade e seguiu seu caminho pela mata.
No entanto, nos meses seguintes, a equipe da ONG Onçafari começou a perceber algo diferente. Ao contrário do que acontece com animais recém-reintroduzidos, Miranda não vagava grandes distâncias. Em vez disso, ela havia escolhido uma área de mata fechada e permanecia por ali, dia após dia, sempre circulando em torno de pontos muito próximos.
Esse padrão, aliás, chamou a atenção justamente por destoar do comportamento típico de onças em fase de readaptação. Por isso, os especialistas passaram a suspeitar de algo a mais.
Esse comportamento era conhecido. As fêmeas costumam agir assim quando têm filhotes. Mas ninguém queria se antecipar. Era cedo demais para comemorar.
A surpresa que emocionou o país
Demorou. Mas, um dia, as imagens vieram. As câmeras instaladas na mata captaram Miranda caminhando com um filhote. Pequeno, curioso, seguindo os passos da mãe.
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O registro correu o país. Era mais do que uma boa notícia. Era um milagre.
Miranda, que quase morreu no fogo, tinha sobrevivido. Mais do que isso: tinha gerado vida.
Um símbolo da resistência pantaneira
A história de Miranda é o retrato do Pantanal em tempos difíceis. Ela resistiu às chamas, às dores, ao confinamento, ao medo e voltou à mata mais forte do que saiu.
Sua sobrevivência é mérito de quem agiu rápido. Mas também é um lembrete: sem prevenção, sem fiscalização, sem investimento, o Pantanal vai continuar sangrando.
Porque, no fim, Miranda sobreviveu. Mas nem todos os bichos têm a mesma sorte.
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