O avanço implacável do huanglongbing (HLB ou greening), doença que devasta pomares de citros em todo o mundo, está reconfigurando a citricultura brasileira. O tradicional Cinturão Citrícola, que abrangia São Paulo (exceto o litoral), Triângulo Mineiro e sudoeste de Minas Gerais, agora se expande para Mato Grosso do Sul, Goiás, Paraná e Distrito Federal, formando o Cinturão Citrícola Expandido (CCE). Pesquisadores da Embrapa e do Fundecitrus lideram iniciativas inéditas de zoneamento climático e fitossanitário para orientar produtores na migração estratégica.
Expansão para o Cinturão Citrícola Expandido
“A Embrapa está imbuída em colaborar de todas as formas para mitigar e controlar o huanglongbing , mas a avaliação de que a citricultura pode mudar e se expandir para novas áreas é uma realidade”, afirma Francisco Laranjeira, chefe-geral da Embrapa Mandioca e Fruticultura. “Vamos seguir nessa linha, procurando avaliar todo o País. É um compromisso com a cadeia produtiva”, reforça.
Com o Zoneamento Agrícola de Risco Climático (Zarc), ferramenta que mapeia vulnerabilidades climáticas em municípios brasileiros, cientistas identificaram regiões com menor risco para a instalação de novos pomares. “Conseguimos separar áreas limítrofes do Cinturão Citrícola tradicional e diagnosticar possibilidades de expansão”, explica Mauricio Coelho, coordenador do Zarc Citros. O estudo considera fatores como déficit hídrico e temperaturas elevadas, críticos para floração e frutificação.

Um projeto financiado pela Fapesp até 2026 avança no zoneamento de riscos fitossanitários, focando no psilídeo (vetor do HLB) e na podridão floral dos citros. “Queremos gerar mapas de favorabilidade para essas pragas no CCE, auxiliando produtores a tomar decisões em cenários climáticos futuros”, afirma Alécio Moreira, analista da Embrapa. Os primeiros resultados devem sair em 2025.
Renato Bassanezi, pesquisador do Fundecitrus, destaca que a migração ganhou força em 2023 e segue em ascensão: “Em 2024, produtores intensificaram a busca por áreas livres do greening”. Apesar do aumento da doença em São Paulo (de 38% para 44% em 2024), o ritmo de crescimento diminuiu, sinalizando controle parcial.
Desafios logísticos e climáticos
Danilo Yamane, da FortCitrus Consultoria, aponta três obstáculos para a expansão: clima adverso, logística distante dos polos processadores e falta de mão de obra especializada. “Temperaturas altas prejudicam a fisiologia da planta, e regiões novas carecem de infraestrutura consolidada”, explica.
Para enfrentar esses desafios, empresas como a Cambuhy Agrícola já migraram parte de seus cultivos. “Plantamos 1.200 hectares em Mato Grosso do Sul, gerando 1.200 empregos diretos”, relata Fabrício Lanza, gerente da empresa. A Agroterenas também investiu no estado: “Iniciamos 1.500 hectares em 2024, com orientação técnica da Embrapa sobre porta-enxertos e manejo”, diz Ezequiel Castilho, diretor da AGT Citrus.
Por trás dos dados: processamento em tempo real
Eduardo Monteiro, da Embrapa Agricultura Digital, detalha a base tecnológica do Zarc: “Processamos 4 mil séries históricas de clima, simulando cenários para diferentes solos e ciclos de cultivo”. Os dados, validados por especialistas e setor produtivo, orientam portarias do Ministério da Agricultura.
Enquanto o huanglongbing pressiona o coração citrícola paulista, a ciência abre rotas para uma nova geografia agrícola. Com investimento em pesquisa e adaptação logística, o Brasil busca manter sua liderança global na produção de laranjas, mesmo sob a sombra do greening.
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