Resumo da notícia
- A colaboração entre Embrapa, órgãos estaduais e prefeituras recuperou 95% da produção de uvas Niágara no Circuito das Frutas, após epidemia de podridão madura causada pelo fungo Glomerella cingulata em 2024.
- A doença devastou lavouras em várias cidades paulistas, causando perdas de até 100% e ameaçando eventos tradicionais como a Festa da Uva de Jundiaí.
- O Plano Emergencial aplicou protocolo científico com práticas integradas de controle, incluindo eliminação de restos culturais, uso calibrado de fungicidas e manejo rigoroso, alcançando recuperação significativa.
- Produtores que adotaram as técnicas recomendadas melhoraram o manejo, evitaram perdas e retomaram a produção, enquanto pesquisas avançam para desenvolver um protocolo definitivo contra a doença.
Uma colaboração estratégica entre Embrapa, órgãos estaduais e prefeituras paulistas conseguiu reverter uma das piores crises já enfrentadas pela viticultura do estado. O Plano Emergencial de Controle à Podridão Madura da Uva recuperou 95% da produção de uvas Niágara em propriedades do Circuito das Frutas, principal polo vitícola de São Paulo.
Em 2024, a região foi assolada por uma epidemia da podridão da uva madura, causada pelo fungo Glomerella cingulata. A doença dizimou lavouras inteiras em Jundiaí, Louveira, Itatiba, Itupeva, Jarinu, Indaiatuba e Elias Fausto, com perdas chegando a 100% em algumas propriedades.
“A doença ainda persiste em alguns parreirais, mas com incidência bem menor”, explica Sérgio Mesquita Pompermaier, diretor do Departamento de Agronegócio da Prefeitura de Jundiaí.
- Inteligência Artificial no WhatsApp revoluciona controle de custos agrícolas
- Cajueiro-anão revoluciona agricultura do nordeste
O impacto foi tão severo que chegou a ameaçar eventos tradicionais como a Festa da Uva de Jundiaí.
Ciência e técnica como salvação
O plano selecionou 13 propriedades rurais para aplicação de protocolo científico desenvolvido pela Embrapa Uva e Vinho (RS) e Embrapa Territorial (SP). As propriedades que seguiram 100% das orientações técnicas alcançaram índices de recuperação de até 95%, enquanto outras obtiveram melhorias de até 70%.
Lucas Garrido, pesquisador da Embrapa Uva e Vinho, identificou que a epidemia resultou de uma combinação fatal: temperaturas acima da média, umidade constante e presença de restos culturais contaminados. Porém, os prejuízos foram amplificados por falhas no manejo.
“Em alguns casos, o produto certo estava na propriedade, mas não foi utilizado. Ou foi aplicado de forma errada”, destaca Rafael Mingoti, analista da Embrapa Territorial e coordenador da iniciativa.
Do desespero ao sucesso: história de superação
Atalívio Rufino, produtor de Elias Fausto, exemplifica a transformação possível. Em 2024, perdeu quase toda a produção. Assim, ele foi obrigado a dispensar funcionários. Sua propriedade, selecionada para os experimentos da Embrapa, hoje colhe os frutos da mudança de manejo.

“Antes, retirávamos os galhos e cachos que apodreciam sem tanto zelo. Agora, estamos retirando, queimando ou descartando longe. Também regularizamos o equipamento e aumentamos o volume de calda”, relata o produtor.
Protocolo técnico baseado em evidências
O protocolo desenvolvido inclui práticas integradas de controle:
- Eliminação rigorosa de restos culturais infectados
- Aplicações preventivas durante dormência hibernal
- Uso de fungicidas eficazes em estágios estratégicos (floração, grão-ervilha, pré-fechamento do cacho)
- Alternância entre produtos sistêmicos e de contato
- Ajuste e calibragem adequada de pulverizadores
- Utilização de produtos biológicos na maturação final
Pesquisa avança para protocolo definitivo
Estudos conduzidos pelo Instituto Biológico estão identificando as espécies do fungo Colletotrichum presentes na região. A diversidade encontrada explica a variabilidade de resposta aos tratamentos e reforça a importância do diagnóstico preciso.
“Ainda não é possível afirmar se há resistência a algum fungicida, mas uma possível presença de múltiplas espécies reforça a importância de conhecer bem as causas do problema”, explica Mingoti.
Os dados coletados embasarão uma proposta submetida à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) para desenvolvimento de sistema de aviso e protocolo consolidado de manejo integrado.
Capacitação técnica em setembro
Os resultados e recomendações serão apresentados em eventos técnicos nos dias 16 e 18 de setembro. O seminário ocorrerá na Associação Agrícola de Jundiaí (13h30-18h30), enquanto o Dia de Campo acontecerá no Sítio Dois Irmãos, em Elias Fausto (14h-17h).

Apesar do sucesso, os especialistas alertam que não é momento para relaxar. “Não é hora de abaixar a guarda”, reforça Mingoti. “É essencial manter a vigilância, aplicar corretamente os defensivos e eliminar restos culturais. Só assim vamos consolidar os avanços obtidos.”
A recuperação da viticultura paulista demonstra como a parceria entre ciência e produtores pode superar desafios aparentemente impossíveis, garantindo a sustentabilidade de uma atividade econômica centenária e tradicional do estado.