Resumo da notícia
- O jambu, planta amazônica conhecida pelo efeito formigante causado pelo espilantol, é usado em pratos típicos e em produtos inovadores como cachaça, molhos e estimulantes sexuais.
- Tatiana Sinimbu, arquiteta que mudou de carreira, fundou a Jambu Sinimbu e desenvolveu o spray sexual "Tremidão da Sinimbu", reconhecido por sua eficácia e premiado nacional e internacionalmente.
- O espilantol presente no jambu proporciona analgesia, melhora circulação e reduz inflamação, com estudos da UFPA confirmando seus benefícios para o sistema cardiovascular e alívio temporário da dor.
- O cultivo do jambu no Pará é realizado por pequenos produtores periurbanos, garantindo a produção da planta para uso culinário e científico, valorizando a cultura e economia local.
O jambu desperta sensações únicas em quem o experimenta, seja em pratos típicos como o tacacá ou em novos produtos que exploram suas propriedades. A planta herbácea, cientificamente conhecida como Acmella oleracea, pertence à família Asteraceae e alcança até 40 centímetros de altura. Suas folhas apresentam formato oval com textura levemente áspera, enquanto as flores amarelas formam inflorescências pequenas, popularmente chamadas de “botões de jambu”.

A arquiteta Tatiana Sinimbu decidiu mudar de carreira aos 40 anos para se dedicar ao estudo científico do jambu. A empresa Jambu Sinimbu atua no desenvolvimento de produtos derivados do extrato etanólico da planta e apresenta um portfólio que inclui cachaça de flor de jambu, conserva, molho de pimenta e um estimulante sexual feito com o concentrado da planta. Tatiana aproveitou o momento de aprovação no mestrado em engenharia industrial na Universidade Federal do Pará para desenvolver pesquisas e novos produtos relacionados ao jambu.
Do prato à pesquisa científica
Tatiana decidiu envolver a planta amazônica no sexo e, após longas pesquisas, criou o spray “Tremidão da Sinimbu”. Mais de 10 quilos de flores de jambu foram usados em três meses de testes para chegar à fórmula perfeita desse concentrado. Tão concentrada que apenas uma gota é suficiente para fazer efeito. Além do sucesso de vendas, esse produto também rendeu à Tatiana prêmios no Brasil e na Alemanha.
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Segundo a criadora do Tremidão, o extrato, ao ser borrifado nas “partes íntimas”, causa uma série de sensações estimulantes, retarda a ejaculação e promove maior lubrificação natural. A ginecologista e sexóloga Érika Mendonça das Neves, doutoranda na Universidade de São Paulo, explica que o poderoso líquido e seus “choquinhos” são frutos do efeito do espilantol, presente na erva.
Espilantol: o segredo por trás do formigamento
A característica de formigamento e leve anestesia se deve à presença de espilantol, um composto bioativo encontrado nas folhas e flores do jambu. A analgesia atrai maior atenção, tanto nos apreciadores das iguarias, que sentem a dormência na boca durante a refeição, como nos pesquisadores. Já se sabe, desde os anos 1950, que os efeitos anestésicos e analgésicos são provocados pela substância espilantol.
Estudos desenvolvidos nos laboratórios do Parque de Ciência e Tecnologia (PCT) Guamá, ligado à UFPA e com sede em Belém, confirmam cientificamente os efeitos transmitidos por meio da cultura popular. Investigações mostraram que o espilantol interage com os receptores nervosos para proporcionar alívio temporário da dor, melhorar a circulação e reduzir a inflamação. Análises laboratoriais também descobriram que o composto pode causar efeitos benéficos ao sistema cardiovascular, ajudando a prevenir sintomas de arritmia.
Cultivo e produção no Pará
Produtores periurbanos cultivam jambu em pequenas áreas, junto com outras hortaliças, para abastecer a cidade de Belém e os principais centros urbanos da mesorregião do Nordeste Paraense. A produção dessa hortaliça acontece em baixa escala, concentrada no Estado do Pará, onde ocorre também a maior demanda, principalmente durante o Círio de Nazaré.
A planta prefere climas quentes e úmidos, típicos da região Amazônica, e pode ser cultivada em solos ricos e bem drenados. A produção de jambu durante o ano sofre flutuações. No Norte do país, a demanda por jambu aumenta em períodos de datas comemorativas, elevando o preço para valores entre R$ 1,50 e R$ 2,00 por maço. Feirantes da região metropolitana de Belém informaram um consumo médio de 15 quilos por dia.
Para atender o consumo do Círio seriam necessários 5 hectares de canteiros de jambu para ser consumida em apenas um dia. Isso significa geração de renda e emprego para pequenos produtores localizados na zona Bragantina e, principalmente, nos municípios de Santo Antônio do Tauá e Santa Izabel do Pará, com destaque na produção de jambu.
Múltiplas aplicações e diversificação de produtos
As culinárias amazonense, amapaense, rondoniense, acriana e paraense utilizam amplamente o jambu, presente em iguarias tradicionais como o tacacá e o pato no tucupi. No Pará, a planta é um ingrediente indispensável na preparação de pratos típicos, como o famoso tacacá, feito tradicionalmente com tucupi, goma de tapioca dissolvida, folhas cozidas de jambu e camarão.

Empresas de cosméticos têm explorado as propriedades únicas do Jambu, como seu efeito anestésico natural, para criar produtos inovadores. O mercado de cosméticos à base de Jambu está em expansão. Com produtos que prometem benefícios como a redução de linhas de expressão e um efeito lifting natural. O extrato de jambu tem chamado a atenção da classe média com promessa de efeito anti-idade.
Propriedades medicinais e nutricionais
A planta apresenta propriedades anestésicas, diuréticas, digestivas, sialagogas, antiasmáticas e antiescorbúticas. Os seus capítulos possuem propriedades odontálgicas e antiescorbúticas. O jambu apresenta teor proteico de 3,08% e se destaca como uma hortaliça hipocalórica e hipolipídica.
Povos indígenas e ribeirinhos utilizam a planta como analgésico e anestésico no tratamento de aftas, herpes, dores de dente e de garganta. Duas outras propriedades conhecidas dessa planta, a de fungicida e de combate a carrapatos, despertaram o interesse de alguns pesquisadores com o objetivo de desenvolver medicamentos.
Potencial econômico e bioeconomia amazônica
Em 2022, o governo estadual lançou o Plano Estadual para Bioeconomia (PlanBio), dando o “caminho das pedras” para transformar a biodiversidade da Amazônia em um sistema econômico sustentável. A iniciativa estabelece dezenas de ações focadas no fortalecimento de cadeias produtivas que valorizam produtos florestais como o jambu, o açaí e a copaíba.
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Para Alfredo Homma, pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), usar a ciência para elevar o conhecimento tradicional e o cultivo sustentável é “a única maneira” de impulsionar o crescimento econômico sem abrir mão de metas de conservação.
Variedades
A variedade mais conhecida e cultivada é o Jambuaçú, ou Botão-de-ouro, que se diferencia pelas inflorescências pequenas, em formato cônico e de coloração amarela intensa. A Jamburana possui uma inflorescência significativamente maior que a do Jambuaçú. Os produtores cultivam a planta para obter flores secas, que servem como matéria-prima na elaboração da Cachaça de Jambu, além de geleias e conservas.
Pesquisadores desenvolveram o Jambu Nazaré, conhecido como “Jambu Roxinho”, ao cruzar e selecionar espécimes de jambu com resistência às pragas mais comuns do cultivo, como o carvão e a ferrugem. Essa variedade assemelha-se à Jamburana na sua morfologia, porém possui um halo de cor arroxeada ou avermelhada no ápice da inflorescência.
A urbanização e a especulação de terras nas áreas próximas de Belém, o surgimento de polos de produção em outros estados e países, o processo de patenteamento para novos produtos no exterior e uso na gastronomia nacional e internacional estão transformando o jambu em uma nova hortaliça dos trópicos.
Pesquisadores da Embrapa avaliam o potencial de subsistemas hidropônicos para a produção de jambu integrados ao cultivo de tambaqui. Isso tendo em vista a demanda mundial por sistemas agropecuários mais produtivos e sustentáveis. Segundo a Flavor and Extracts Manufactures Association (FEMA), o jambu é um alimento classificado como GRAS (Generally Recognized as Safe), ou seja, seguro para consumo em produtos alimentícios.
A história do jambu exemplifica como o conhecimento tradicional, aliado à pesquisa científica e ao empreendedorismo, pode transformar um ingrediente regional em um produto de alto valor agregado. E beneficiar produtores locais, valorizando a biodiversidade amazônica.