Resumo da notícia
- A febre Oropouche se espalhou para 22 estados brasileiros, com 13,8 mil casos confirmados em 2024, concentrando 45% no Espírito Santo, e 11.930 casos até outubro de 2025, incluindo cinco mortes confirmadas.
- São Paulo registrou aumento de mais de 2.000% nos casos entre 2024 e 2025, passando de 8 para 161 infectados, gerando alerta para reforço na vigilância epidemiológica.
- O surto é impulsionado por calor, chuvas intensas e desmatamento, que favorecem a reprodução do mosquito-pólvora, vetor da doença, especialmente em áreas periurbanas com indicadores socioeconômicos desfavoráveis.
- Estudo aponta que o desmatamento reduz predadores naturais do mosquito e cultivos como banana e algodão ajudam a manter larvas, enquanto o fenômeno El Niño e o aquecimento global intensificam o ambiente propício à proliferação do vetor.
O Brasil enfrenta um surto sem precedentes de febre Oropouche. A doença, que até 2023 estava restrita à região amazônica, avançou para 22 das 27 unidades federativas do país, alarmando autoridades sanitárias e cientistas. Em 2024, foram registrados 13,8 mil casos confirmados no território nacional, 45% deles concentrados no Espírito Santo, que lidera o ranking com 6,3 mil infectados.
Os números de 2025 mostram que o vírus mantém ritmo acelerado de contágio. Dados da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) apontam 12,7 mil casos confirmados nas Américas até agosto, sendo 11,8 mil apenas no Brasil. O Ministério da Saúde contabiliza 11.930 infectados até 30 de outubro, com cinco mortes confirmadas e duas sob investigação.
São Paulo registra crescimento explosivo de casos
No estado de São Paulo, o avanço da febre Oropouche impressiona: de apenas 8 casos em 2024, o número saltou para 161 até setembro de 2025, segundo a Secretaria Estadual de Saúde. O crescimento de mais de 2.000% acende o alerta sobre a necessidade de vigilância epidemiológica reforçada.
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Um estudo publicado na revista científica PLOS One em julho identifica os principais fatores por trás da expansão geográfica do vírus Orthobunyavirus oropoucheense (OROV). Pesquisadores da Unesp, USP e Instituto Butantan descobriram que temperaturas elevadas e índices de precipitação acima da média criam condições ideais para a reprodução do mosquito-pólvora (Culicoides paraensis), vetor da doença.
O fenômeno El Niño, ocorrido entre 2023 e 2024, combinado ao aquecimento global, intensificou as chuvas e o calor em regiões antes menos afetadas, facilitando a proliferação do inseto transmissor.
Desmatamento reduz predadores naturais do mosquito-pólvora
Tiago Salomão, pós-doutorando da Unesp e autor do estudo, explica que o desmatamento para criação de pastagens e monoculturas diminui a biodiversidade, eliminando predadores e competidores naturais dos maruins.
“Em biomas preservados, há mais concorrência com outros insetos e os Culicoides não conseguem se multiplicar no mesmo ritmo”, afirma o pesquisador, que investiga a relação entre mudanças climáticas e doenças epidêmicas.
A pesquisa revela ainda que cultivos de banana, dendê e algodão favorecem a subsistência das larvas do mosquito, devido ao acúmulo de matéria orgânica em decomposição no solo.
O estudo identifica que regiões periurbanas — de transição entre campo e cidade — são mais afetadas que ambientes exclusivamente rurais ou urbanos. Indicadores socioeconômicos desfavoráveis também se associam a maior incidência de casos, destacando a dimensão social da epidemia.
Nova variante pode ser 100 vezes mais transmissível
Além dos fatores ambientais, evidências laboratoriais sugerem que uma mutação genética recente aumentou significativamente a transmissibilidade do vírus OROV. Experimentos com células de mamíferos mostram que a cepa atual atinge concentrações até cem vezes superiores à versão comum.
Essa variante pode ainda driblar a memória imunológica de pessoas previamente infectadas, tornando-as vulneráveis a uma nova contaminação — um cenário que preocupa infectologistas e epidemiologistas.
No contexto das Américas, o Brasil concentra 93% dos casos de febre Oropouche registrados em 2025. Panamá aparece em segundo lugar com 501 casos, seguido pelo Peru com 330 infecções.
A expansão geográfica sem precedentes da doença demanda vigilância intensificada, investimento em pesquisa científica e ações de preservação ambiental para conter novos surtos.