G20 coloca transformação dos sistemas agroalimentares na pauta global
Foto: Allan Zubiate/Mapa

Líderes de 19 países se reuniram na África do Sul durante a Cúpula do G20 no último final de semana pra discutir a estabilidade econômica mundial. Mas um documento chamou atenção especial: o relatório da Cátedra Josué de Castro que traz dados alarmantes sobre como produzimos nossos alimentos.

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Os números assustam. Sistemas agroalimentares, que incluem tudo desde a produção até o consumo de alimentos, são responsáveis por aproximadamente um terço das emissões globais de gases de efeito estufa. No Brasil, esse percentual salta pra 75%.

“Nossa forma de produzir, distribuir, consumir e descartar alimentos segue um modelo industrial: monoculturas, produção em larga escala, uso intensivo de agrotóxicos e aumento no consumo de produtos ultraprocessados”, explica Roberta Curan, gerente de inteligência do Instituto Comida do Amanhã.

O sistema atual não apenas devora recursos naturais, especialmente água, mas também gera uma crise de saúde pública sem precedentes. Dados de 2022 mostram que quase 40% dos adultos e 20% das crianças enfrentam sobrepeso ou obesidade. Paradoxalmente, 2,3 bilhões de pessoas vivem em insegurança alimentar no mundo.

Monotonia alimentar: quando a diversidade desaparece do prato

Existe um fenômeno pouco discutido mas extremamente perigoso acontecendo: a monotonia alimentar. Esse processo padroniza paisagens agrícolas e limita escolhas alimentares da população por causa de múltiplos fatores ligados à produção, distribuição e consumo.

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“Tudo isso mostra que estamos diante de uma crise que é, ao mesmo tempo, alimentar, ambiental e de saúde, e que está profundamente ligada aos sistemas agroalimentares atuais”, completa Roberta Curan.

Os custos indiretos dessa crise somam cerca de US$ 12 trilhões anualmente quando consideramos impactos ambientais e questões de saúde.

Por que o G20 precisa agir agora

O G20 reúne as economias mais desenvolvidas e em desenvolvimento do planeta, incluindo a União Africana e União Europeia. Segundo Nadine Marques, pesquisadora da Cátedra Josué de Castro, esse fórum está numa posição única pra liderar mudanças.

“O G20 está em uma posição estratégica para liderar um processo de transformação desses sistemas, a partir de uma abordagem integrada entre as políticas agrícolas e as alimentares”, afirma Nadine.

Ela destaca ainda que grande parte das multinacionais do sistema agroalimentar, incluindo indústrias de agrotóxicos, criação animal e processamento de alimentos, tem origem em países do G20. “Isso faz com que sua contribuição para enfrentar os desafios resultantes dos sistemas agroalimentares seja crucial e indispensável”.

Cinco caminhos para transformar o sistema

O relatório apresenta propostas concretas pro G20 liderar essa transformação:

  1. Fortalecer serviços ecossistêmicos – Investir em infraestrutura agrícola que garanta resiliência e sustentabilidade real.
  2. Regenerar solos e tecnologia – Recuperar terras degradadas enquanto aumenta autonomia tecnológica do setor.
  3. Regular antibióticos – Controlar o uso de antibióticos na produção animal, evitando resistência bacteriana.
  4. Mudar padrões de consumo – Estimular consumo de alimentos frescos e reduzir presença de ultraprocessados nas dietas.
  5. Governança global justa – Adaptar financiamento e políticas pra que pequenos produtores e países menos favorecidos possam participar da transição.

A questão agora é saber se os líderes mundiais vão transformar essas propostas em ações concretas ou se continuaremos assistindo o planeta pagar a conta de um sistema alimentar insustentável.