Répteis usam vocalizações profundas e infrassons para comunicação durante reprodução e demarcação de território
Foto: Divulgação - SOS Pantanal

Imagine estar às margens de um rio no Pantanal e, de repente, avistar círculos concêntricos se formando na água ao redor de um jacaré. O animal permanece quase imóvel enquanto seu corpo inteiro vibra, emitindo um som grave e profundo que ecoa pela paisagem. Esse fenômeno fascinante tem nome: esturro ou brunido, uma forma sofisticada de comunicação utilizada por esses répteis há milhões de anos.

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O esturro representa um comportamento impressionante dos jacarés, no qual o animal emite vocalizações profundas enquanto todo o corpo vibra, gerando padrões circulares na superfície da água. O som alto e profundo vem precedido por pulsos de infrassons, que criam a impressão de que a água ao redor do animal dança ou ferve.

Guias turísticos e fotógrafos de vida selvagem capturam esse momento único no Pantanal mato-grossense, revelando um dos comportamentos mais extraordinários da fauna brasileira. A força das vibrações demonstra a potência física desses predadores e sua capacidade de manipular o ambiente ao seu redor.

Múltiplas funções da vocalização

O esturro serve para diversas finalidades: marcar território, demonstrar força, afastar rivais e atrair fêmeas durante o período reprodutivo. Esse sistema de comunicação complexo vai muito além de simples barulhos aleatórios.

Tanto machos quanto fêmeas produzem essa vocalização, porém apenas os machos geram o pulso de infrassons antes do rugido audível. Essa diferença sexual na comunicação desempenha papel crucial durante a época de acasalamento, quando os machos competem pela atenção das fêmeas.

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O rugido ocorre durante todo o ano, mas torna-se mais frequente na temporada de cortejo, quando jacarés rugem diariamente em coros para atrair parceiros. As fêmeas geralmente iniciam esse coro, mas os machos parecem perpetuá-lo.

A física por trás das vibrações na água

O jacaré macho emite um som de baixa frequência, chamado infrassom, que faz as águas ao seu redor tremerem para atrair potenciais parceiros. O ouvido humano não consegue captar completamente esses sons, o que torna o fenômeno ainda mais intrigante.

Os cientistas denominam esse sinal infrassônico de “vibrações subaudíveis”. Essas vibrações criam ondas que podem auxiliar parceiros em potencial a encontrar os jacarés, ou podem ser apenas um efeito colateral da vocalização. A pesquisa sobre esse fenômeno continua revelando novos aspectos da comunicação animal.

Seis espécies de jacarés vocalizam no brasil

Os jacarés se comunicam com outros indivíduos através da emissão de sons, sendo que os machos também efetuam movimentos com a cauda. No Brasil, seis espécies desenvolveram essa capacidade de vocalização: jacaré-paguá ou jacaré-anão (Paleosuchus palpebrosus), jacaré-açu (Melanosuchus niger), jacaré-do-papo-amarelo (Caiman latirostris), jacaré-do-pantanal (Caiman yacare), jacaretinga (Caiman crocodilus) e jacaré-coroa (Paleosuchus trigonatus).

Durante o período reprodutivo, que ocorre entre outubro e fevereiro, o macho busca a atenção das fêmeas através de comportamentos diversos, incluindo elevar o corpo, produzir vibrações na água e emitir sons.

Comunicação além do esturro

A comunicação dos jacarés não se limita aos sons produzidos por adultos. Os filhotes vocalizam para a mãe ainda dentro dos ovos, indicando que chegou a hora de nascer. Esses sons também avisam aos outros filhotes que o momento do nascimento chegou.

Quando um jacaré se sente estressado, ansioso, chocado ou assustado, ele pode produzir um som de ganido, que consiste em um breve choro ou lamento. Essa variedade de vocalizações demonstra a complexidade do sistema de comunicação desses animais.

A importância ecológica dos jacarés

Os jacarés são predadores topo de cadeia alimentar, e eliminar essas espécies traria consequências desastrosas para outras espécies e para o próprio ser humano. Eles controlam populações de presas e mantêm o equilíbrio dos ecossistemas aquáticos.

O jacaré-de-papo-amarelo, por exemplo, alimenta-se principalmente de moluscos gastrópodes disseminadores de doenças nas populações ribeirinhas. Nos ambientes onde o jacaré foi eliminado, cresce a incidência de barriga d’água entre a população e o gado próximo aos rios.

Fotógrafos e guias turísticos que vivem imersos na natureza brasileira reforçam a importância de cuidar dos biomas onde esses animais vivem. O Pantanal, a Amazônia e o Cerrado abrigam populações essenciais de jacarés que contribuem para a biodiversidade do país.

Todas as espécies de jacaré no Brasil estão classificadas como não ameaçadas de extinção em nível nacional, embora algumas enfrentem pressões regionais devido à perda de habitat. A observação responsável desses animais em seu ambiente natural permite que cientistas e admiradores da natureza compreendam melhor seus comportamentos e contribuam para sua conservação.