Uma pesquisa inovadora da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (DF) identificou genes do cupuaçuzeiro (Theobroma grandiflorum) relacionados à resistência à infecção pelo fungo Moniliophthora perniciosa, causador da vassoura-de-bruxa. Essa doença representa um grande desafio tanto para a cultura do cupuaçu quanto para a do cacau, trazendo prejuízos significativos para os agricultores.
A vassoura-de-bruxa é uma doença que afeta as plantas, levando a um crescimento anômalo e à morte dos galhos infectados. Enquanto o cacau já conta com um volume considerável de pesquisas sobre a doença, o cupuaçu ainda possui um grande potencial a ser explorado. O sequenciamento do transcritoma do cupuaçuzeiro permitiu a identificação de milhares de genes que podem apoiar estudos sobre outras doenças ou características de interesse, como produtividade e qualidade da polpa e das sementes.
Metodologia utilizada
s pesquisadoras Lucilia Helena Marcellino e Loeni Ludke Falcão conduziram o estudo pioneiro na análise da expressão gênica em grande escala voltada para a cultura do cupuaçu. Elas realizaram a pesquisa utilizando o sequenciamento de alta profundidade do transcritoma da planta, com foco nas regiões meristemáticas localizadas nas pontas dos galhos, alvos do ataque do patógeno.
O transcritoma é o conjunto completo de transcritos (incluindo RNAs mensageiros, RNAs ribossômicos, RNAs transportadores e microRNAs) de um organismo. A análise desse conjunto é uma ferramenta poderosa para estudar a expressão gênica, permitindo que os cientistas desvendar os mecanismos moleculares envolvidos nos diferentes processos biológicos.
Resultados e implicações
Os resultados obtidos representam um avanço significativo no entendimento da interação entre o cupuaçuzeiro e o fungo causador da vassoura-de-bruxa. “Diferentemente do cacau, que já conta com um volume considerável de pesquisas, o cupuaçu ainda possui um grande potencial a ser explorado, especialmente no desenvolvimento de cultivares resistentes e no controle de doenças”, afirma Falcão.
O sequenciamento gerou um vasto banco de dados que permitiu identificar genes relacionados à resposta à infecção por M. perniciosa. Foram registrados milhares de genes expressos tanto em plantas suscetíveis quanto nas resistentes. “Por meio da análise bioinformática desses dados, foi possível identificar genes relacionados à resposta imune da planta, ao metabolismo secundário e ao crescimento”, explica Marcellino.
Desenvolvimento de novas estratégias
Essas informações detalhadas sobre a interação planta-patógeno são fundamentais para o desenvolvimento de novas estratégias de controle da vassoura-de-bruxa. Isso inclui a criação de marcadores moleculares para a seleção de plantas resistentes e a identificação de alvos para novos fungicidas.
“Nossa pesquisa é um trabalho básico que pode ajudar os melhoristas no desenvolvimento de plantas resistentes à doença. E disponibilizar genes de interesse para estudos de função”, afirma Falcão. Alguns desses genes foram até inseridos em tomates Micro-Tom, uma planta-modelo para estudos com o fungo. Assim, permitindo um aprofundamento sobre a função e potencial uso desses genes.
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Marcellino também está envolvida em uma parceria com a Embrapa Agricultura Digital (SP) para sintetizar uma molécula capaz de inibir o fungo ao se ligar a uma proteína presente no microrganismo. A expectativa é que essa tecnologia seja eficaz no controle tanto da M. perniciosa quanto da M. roreri, outra praga quarentenária que já está entrando no Brasil.
“A obtenção de plantas que combinem resistência, boa produção e qualidade dos frutos é essencial para o desenvolvimento da cultura. Contudo, o menor conhecimento sobre a genética molecular do cupuaçuzeiro representa um gargalo para o desenvolvimento dessas plantas. Por isso, essa pesquisa é tão importante”, declara Marcellino.
Compreendendo a vassoura-de-bruxa
A pesquisa também se concentra em entender os processos iniciais da infecção pela Moniliophthora perniciosa. Durante essa fase inicial, o patógeno infecta áreas intercelulares de certos tecidos, causando crescimento anormal dos galhos devido à sua capacidade de manipular molecularmente a planta.
“O fungo provoca o desenvolvimento excessivo de galhos laterais, resultando em uma estrutura semelhante a uma vassoura — daí o nome vassoura-de-bruxa”, explica Falcão. Esse crescimento anômalo leva a planta a enviar grandes quantidades de nutrientes para esses galhos, que se tornam maiores e mais vigorosos do que os demais.
Após cerca de 30 a 60 dias de infecção, ocorre uma reação natural que resulta na morte do galho infectado, mas ele permanece na árvore. Nesse estágio, M. perniciosa passa da fase biotrófica para uma fase necrotrófica, onde suas ramificações crescem abundantemente. “O galho vigoroso produzido pela planta se torna alimento para o fungo por um longo período”, destaca Falcão.
Além disso, essa situação permite ao microrganismo ter menos concorrência com outros fungos e bactérias do solo (já que o galho não cai). E também facilita a dispersão dos esporos pelo vento. Trata-se de uma doença difícil de controlar, exigindo práticas como poda fitossanitária e uso de fungicidas.
A pesquisa realizada pela Embrapa representa um passo importante na luta contra a vassoura-de-bruxa no cupuaçu. A identificação dos genes relacionados à resistência e suscetibilidade ao fungo permite o desenvolvimento de novas estratégias para proteger essa cultura vital. O avanço na compreensão das interações planta-patógeno não apenas ajudará na produção sustentável do cupuaçu no Brasil. Também poderá abrir novas possibilidades para o cultivo saudável dessa planta tão valorizada no mercado.