Os produtores de Mato Grosso do Sul, especialmente na região sul do estado, estão enfrentando sérios desafios devido ao fenômeno conhecido como veranico, caracterizado pela escassez de chuvas durante o desenvolvimento das culturas de verão, em particular a soja. O calor intenso e a falta de precipitação têm afetado negativamente a produtividade das lavouras, levando especialistas a alertar sobre a importância da adoção de práticas agrícolas adequadas.
De acordo com Fernando Mendes Lamas, pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste, o momento atual é crucial para os produtores implementarem estratégias que minimizem os efeitos de futuras estiagens. “Agora vai começar o momento da colheita da soja e é a oportunidade ideal para o produtor colocar em prática alguns processos que vão garantir que a água da chuva infiltre e seja armazenada no solo”, afirma Lamas.
Práticas recomendadas
Uma das principais práticas recomendadas é o terraceamento, uma técnica de conservação que evita o escorrimento superficial da água, permitindo que ela infiltre no solo. Além disso, os produtores podem se beneficiar do Zonamento Agrícola de Risco Climático (ZARC), uma ferramenta desenvolvida pela Embrapa que orienta sobre as melhores épocas para semeadura, reduzindo riscos associados ao déficit hídrico.
O manejo adequado do solo também é fundamental para garantir que a água permaneça nas camadas mais profundas. Lamas destaca que muitos agricultores utilizam apenas o escarificador para romper camadas compactadas do solo, mas essa prática deve ser complementada com o cultivo de plantas de cobertura. Essas plantas ajudam a melhorar a estrutura do solo, aumentando sua porosidade e facilitando a retenção de água.
As plantas de cobertura não apenas melhoram a infiltração da água. Mas também formam uma camada protetora que reduz a evaporação e controla o crescimento de ervas daninhas. Entre as espécies recomendadas estão gramíneas e leguminosas, que também contribuem para a fixação de nitrogênio no solo.
Desafios das mudanças climáticas
Lamas alerta que as mudanças climáticas são uma realidade enfrentada pelos produtores. “Quando não adotam essas práticas, dependendo do estágio vegetativo da planta, as plantas podem morrer após uma semana ou dez dias sem chuva”, explica. A implementação dessas técnicas pode reduzir o estresse hídrico e melhorar a disponibilidade de nutrientes no solo.
Lamas destaca que, embora as braquiárias sejam predominantes, também é possível utilizar plantas do gênero Panicum. Embora exijam um manejo mais cuidadoso para evitar problemas como o entouceiramento, que pode dificultar a semeadura. As plantas de cobertura podem ser cultivadas isoladamente ou em consórcio com leguminosas, como o feijão guandu e as crotalárias, que ajudam na fixação de nitrogênio no solo.
Para cada situação, há recomendações específicas sobre quais plantas utilizar. Por exemplo, durante a safrinha, leguminosas como Crotalaria ochroleuca e Crotalaria juncea podem ser cultivadas junto ao milho. Lamas ressalta que a Embrapa disponibiliza variedades de guandu, como BRS Guatã e BRS Mandarim, que são adequadas para consórcios devido ao seu porte e crescimento rápido.
“Agora é o momento adequado para os produtores plantarem milho safrinha de forma consorciada ou optarem por cultivar apenas plantas de cobertura”, indica Lamas. Essa prática não só melhora a estrutura do solo, mas também contribui para a retenção de água e nutrientes.
Irrigação como estratégia complementar
Além das práticas de cobertura, a irrigação é uma estratégia importante para enfrentar períodos de intenso calor e escassez hídrica. O pesquisador Danilton Luiz Flumignan, também da Embrapa Agropecuária Oeste, explica que a irrigação atende às necessidades hídricas das culturas. E deve ser considerada em conjunto com outras práticas agrícolas. “É um erro achar que apenas a irrigação resolverá o problema; é necessário integrar diversas estratégias”, afirma Flumignan.
Os produtores irrigantes têm a vantagem de monitorar os problemas causados pela falta de água e decidir quando irrigar e quanto aplicar. Flumignan destaca que o estado de Mato Grosso do Sul está favorável para a agricultura irrigada. Especialmente após o lançamento do programa estadual MS Irriga em 2024.
Para auxiliar os agricultores na tomada de decisões, a Embrapa Agropecuária Oeste oferece estações de monitoramento climático. Elas fornecem dados diários sobre chuva, temperatura, radiação solar e evapotranspiração. “Esses dados ajudam os produtores a tomar decisões informadas sobre irrigação”, explica Flumignan.
Resultados Positivos da Irrigação
Pesquisas realizadas pela Embrapa mostram que as culturas irrigadas têm apresentado aumentos significativos na produtividade. Nos últimos três anos, a soja irrigada rendeu uma média de 172 sacas por hectare, enquanto a soja em sequeiro produziu apenas 134 sacas. Para o milho, os números foram ainda mais impressionantes: 407 sacas com irrigação contra 253 sacas sem.
A adoção de plantas de cobertura e práticas de irrigação representa uma oportunidade valiosa para os produtores em Mato Grosso do Sul enfrentarem os desafios climáticos atuais. Com o suporte da pesquisa e políticas públicas adequadas, é possível promover uma agricultura mais sustentável e resiliente no estado. A integração dessas técnicas pode resultar não apenas em maior produtividade, mas também em uma melhor gestão dos recursos naturais disponíveis.
Leia mais:
+ Agro em Campo: Bionutrição pode impulsionar segunda safra de milho no Cerrado brasileiro
+ Agro em Campo: Projeto amplia financiamento para agricultores familiares da Região Norte