Resumo da notícia
- Pesquisa da Unesp de Botucatu revelou que defensivos agrícolas, especialmente doses subletais de imidaclopride, causam alterações genéticas em abelhas, afetando funções vitais como imunidade, nutrição e voo.
- O trabalho desenvolvido por Isabella Lippi no Programa de Zootecnia conquistou menção honrosa no Prêmio Capes de Tese 2025, entre 1.543 inscritos, destacando sua relevância nacional.
- Metodologia rigorosa envolveu marcação e rastreamento de abelhas em colmeias experimentais, com análises moleculares no Instituto de Biotecnologia da Unesp, garantindo resultados confiáveis.
- Alterações genéticas causadas por agrotóxicos ameaçam a polinização, colocando em risco a segurança alimentar e a biodiversidade, o que preocupa apicultores e a comunidade científica.
Uma pesquisa desenvolvida na Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da Unesp, campus de Botucatu, ganhou reconhecimento nacional. O trabalho revelou como os defensivos agrícolas afetam os genes das abelhas. A tese conquistou menção honrosa no Prêmio Capes de Tese 2025.
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) divulgou o resultado em 29 de agosto. O prêmio recebeu 1.543 trabalhos inscritos nesta edição.
Isabella Cristina de Castro Lippi desenvolveu a pesquisa no Programa de Pós-graduação em Zootecnia. Ela investigou os efeitos do imidaclopride no transcriptoma de abelhas Apis mellifera africanizadas. O professor Ricardo de Oliveira Orsi orientou o trabalho.
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Os resultados surpreenderam os pesquisadores. Milhares de genes das abelhas sofreram alterações após a exposição aos agrotóxicos. As doses subletais – que não matam imediatamente – causaram mais danos que as letais.

“As alterações na expressão dos genes comprometem funções essenciais”, explica Isabella. “Imunidade, nutrição, metabolismo, comportamento, visão e capacidade de voo ficam prejudicados.”
A pesquisadora destaca a importância das abelhas para a humanidade. Elas polinizam frutas, verduras e castanhas. Muitas plantas dependem exclusivamente da polinização realizada por esses insetos para se reproduzir.
“Quando as abelhas enfrentam ameaças como os agrotóxicos, nossa segurança alimentar fica em risco”, alerta Isabella. “A biodiversidade também sofre consequências graves.”
Metodologia rigorosa garante resultados confiáveis
A equipe desenvolveu o trabalho nas colmeias experimentais da FMVZ, na Fazenda Lageado. Os testes de Biologia Molecular aconteceram no Instituto de Biotecnologia (IBETEC) da Unesp.
Os pesquisadores coletaram quadros de cria com abelhas ainda não emergidas. Aguardaram a eclosão e marcaram as recém-nascidas com caneta colorida no dorso. Após 21 dias, buscaram essas abelhas marcadas entre milhares de indivíduos na colmeia.
“Encontrar as abelhas marcadas era uma tarefa desafiadora”, conta Isabella. “Depois coletávamos com pinça e levávamos ao laboratório para os testes.”
Durante o doutorado, Isabella passou um período na Universidade de Queensland, na Austrália. A parceria internacional resultou na publicação de um artigo científico relevante.
Doses subletais causam mais prejuízos
A descoberta mais alarmante foi sobre as doses subletais. Estas concentrações, que não matam imediatamente, provocaram mais alterações genéticas que as doses letais.
“A abelha não morre logo após o contato, mas sofre efeitos danosos”, explica a pesquisadora. “A morte pode acontecer dias ou semanas depois. Muitas vezes ninguém associa isso ao agrotóxico.”
Esse efeito preocupa especialmente os apicultores. Eles costumam levar colmeias para áreas de cultivo durante o período de floração. O Brasil possui legislação menos rígida sobre agrotóxicos que países europeus.
“Estudos de avaliação de risco são fundamentais”, defende Isabella. “Precisamos de dados científicos sólidos para subsidiar decisões regulatórias.”
NECTAR produz conhecimento para setor apícola
O trabalho integra as atividades do Núcleo de Ensino, Ciência e Tecnologia em Apicultura Racional (NECTAR) da FMVZ/Unesp. Há anos o grupo desenvolve estudos importantes para a comunidade científica e criadores de abelhas.
As pesquisas do NECTAR já serviram de base para restrições regulatórias. O Fipronil, agrotóxico usado no controle de insetos, teve seu uso limitado com base nos estudos do núcleo.
“Testamos diversos agrotóxicos – inseticidas, herbicidas e fungicidas”, comenta o professor Orsi. “Demonstramos efeitos de doses baixíssimas que não causam mortalidade imediata, mas provocam distúrbios ao longo do tempo.”
O orientador destaca a relevância do trabalho de Isabella. A pesquisa se alinha com o conceito de Saúde Única e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU.
Pesquisa terá continuidade internacional
Isabella atualmente trabalha como pesquisadora na Universidade de Queensland. Ela busca implementar projetos similares na Austrália, onde existem poucos estudos na área.
No Brasil, o NECTAR continua desenvolvendo pesquisas sobre agrotóxicos e abelhas. O grupo tem objetivos duplos para o futuro.
“Queremos contribuir para políticas públicas mais rigorosas sobre agrotóxicos”, afirma Isabella. “Também buscamos desvendar os mecanismos de ação em organismos não alvo.”
A pesquisadora acredita que o trabalho pode abrir caminho para novas tecnologias. O desenvolvimento de produtos agrícolas menos prejudiciais ao meio ambiente representa uma meta importante para a sustentabilidade.