Resumo da notícia
- A Embrapa desenvolveu o cajueiro-anão, resistente à seca e pragas, que garantiu produtividade e renda para agricultores familiares no Semiárido nordestino durante a seca entre 2012 e 2017.
- O cajueiro-anão mantém folhas verdes na seca, reduz a transpiração sem perder fotossíntese e otimiza a absorção de água, permitindo produção no período seco, quando outras plantas estão em baixa atividade.
- Foram lançados 13 clones de cajueiro-anão, adaptados ao Semiárido, com produtividade superior à média nacional, destacando-se o CCP 76, preferido para caju de mesa, e o Embrapa 51, que pode atingir até 1.650 kg/ha de castanha.
- No Rio Grande do Norte, produtores como Najara Melo recuperaram áreas devastadas pela seca e pragas ao replantar com clones de cajueiro-anão e práticas de manejo, alcançando produção de até 2 mil quilos de castanha por hectare.
A tecnologia desenvolvida pela Embrapa Agroindústria Tropical está transformando a realidade da agricultura familiar no Semiárido nordestino. O cajueiro-anão, resistente à escassez hídrica e ao ataque de pragas como a mosca-branca, provou sua eficiência durante a devastadora seca que atingiu o Nordeste entre 2012 e 2017, quando outras culturas foram completamente destruídas.
Com produtividade superior a 1.000 quilos de castanha por hectare – mais que o dobro da média nacional de 358 kg/ha – essa inovação não apenas garante renda aos produtores, mas também contribui decisivamente para a permanência das famílias no campo.
Segredo da resistência está na fisiologia única
O diferencial do cajueiro-anão reside em seus mecanismos fisiológicos únicos. Enquanto a maioria das plantas perde folhas para economizar água durante períodos secos, o cajueiro mantém sua folhagem verde, reduzindo a transpiração sem interromper a fotossíntese – processo vital para sua sobrevivência.
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“Poucas espécies frutíferas conseguem produzir em pleno período seco. O auge da produção do caju acontece no segundo semestre, justamente quando a maioria das plantas da Caatinga está em baixa atividade metabólica”, explica Marlos Bezerra, pesquisador da Embrapa Agroindústria Tropical.
A planta desenvolveu ainda a capacidade de otimizar a absorção de água do solo e aproveitar a umidade da madrugada, característica das noites mais amenas do sertão nordestino.
13 clones desenvolvidos para máxima produtividade
O Programa de Melhoramento Genético da Embrapa já lançou 13 clones no mercado, sendo 11 de cajueiro-anão especificamente recomendados para a produção de castanha e pedúnculo. Estes materiais são mais produtivos, resistentes a doenças e perfeitamente adaptados às condições climáticas e de solo do Semiárido.
O clone CCP 76, mais plantado no Nordeste, é recomendado para cultivo no Ceará, Piauí, Rio Grande do Norte e regiões com características similares. Devido ao sabor excepcional do pedúnculo, tornou-se preferido para produção de caju de mesa, alcançando impressionantes 9.600 quilos de pedúnculo por hectare e 1.200 quilos de castanha.

Outros destaques incluem o BRS 226, com produtividade de 1.200 kg de castanhas por hectare, e o Embrapa 51, que pode atingir até 1.650 kg/ha em condições ideais de manejo – quase cinco vezes a média nacional.
Rio Grande do Norte: recomeço após a devastação
A produtora Najara Melo, que administra 1.400 hectares dedicados à cajucultura, vivenciou na pele os benefícios da tecnologia. A seca do início da década passada e o ataque da mosca-branca destruíram 95% dos cajueiros gigantes de sua propriedade.

Em 2016, a família apostou no replantio com clones de cajueiro-anão, adotando práticas adequadas de manejo: podas sistemáticas, nutrição balanceada, controle preventivo de pragas e mecanização. Os resultados surpreenderam: “Conseguimos alcançar 2 mil quilos de castanha por hectare em anos bons”, celebra Najara.
Piauí: transformação de 165 famílias
Na região de Picos, 165 famílias de cinco municípios elevaram significativamente sua produtividade graças aos clones da Embrapa. Segundo Jocibel Belchior Bezerra, presidente da Cooperativa Central de Cajucultores do Piauí (Cocajupi), a revolução foi total.

“Antes, com cajueiros gigantes, esperávamos cinco anos para a primeira colheita. Hoje, com dois anos, o pomar já começa a se pagar”, destaca Bezerra. A produção média atual de 500 quilos de castanha por hectare, mesmo considerada pequena para o potencial da cultura, garante rentabilidade pelo aproveitamento integral do pedúnculo.
Sustentabilidade e mudanças climáticas
No contexto das mudanças climáticas globais, o cajueiro-anão emerge como solução estratégica. Enquanto outras frutíferas demandam grandes volumes de água, o cajueiro produz satisfatoriamente com precipitação anual entre 600 e 800 milímetros.
“No Nordeste, desenvolvemos clones para produção em sistema de sequeiro, com alta performance produtiva que pode superar os parâmetros definidos pela pesquisa”, afirma Gustavo Saavedra, chefe-geral da Embrapa Agroindústria Tropical.
A cultura também contribui para a sustentabilidade ambiental. As árvores reflorestam áreas degradadas, convivem harmoniosamente em consórcio com abelhas (prática adotada em 80% dos pomares), melhoram a polinização e reduzem o uso de defensivos.
Aproveitamento integral maximiza lucros
O conceito de uso integral revolucionou a cajucultura brasileira. Diferente do cajueiro comum, que atinge até 20 metros e dificulta o aproveitamento do pedúnculo, o cajueiro-anão permite colheita manual completa.

Hoje, produtores comercializam:
- Castanha (produto principal)
- Pedúnculo como caju de mesa
- Suco industrial
- Cajuína e derivados
- Bagaço do pedúnculo
- Líquido da Castanha de Caju (LCC)
- Biomassa das podas
Pesquisas avançam para produtos de maior valor agregado, incluindo corantes naturais e fibras para a indústria alimentícia.
Patrimônio genético de mais de 50 anos
O Banco Ativo de Germoplasma de Cajueiro (BAG Caju), mantido em Pacajus (CE) há mais de cinco décadas, concentra a maior coleção de variabilidade genética da espécie mundial, com mais de 700 acessos.
“É um seguro para o futuro. Conserva subsídios genéticos que permitem ao Brasil enfrentar pragas, doenças e mudanças ambientais”, explica Ana Cecília de Castro, curadora do BAG.
A capacidade de adaptação do cajueiro a climas áridos e sua vasta variabilidade genética são aspectos fundamentais para aumentar a resiliência do bioma Caatinga frente às mudanças climáticas.
Com investimentos em tecnologia e gestão adequada, a cajucultura posiciona-se como alternativa estratégica para a agricultura do Semiárido, unindo sustentabilidade, geração de renda e expansão de mercados para as próximas gerações.
Sobre a tecnologia:
- Desenvolvedor: Embrapa Agroindústria Tropical (CE)
- Produtividade: até 1.650 kg de castanha/hectare (média nacional: 358 kg/hectare)
- Resistência: seca, pragas e doenças
- Tempo para produção: 2 anos (cajueiro comum: 5 anos)
- Aproveitamento: integral (castanha + pedúnculo + subprodutos)