A conquista também valoriza a preservação de raças nativas como o porco Piau e oferece alternativas de renda para a agricultura familiar
Foto: Charcutaria Sagrada Família

A Charcutaria Sagrada Família, de Montes Claros, conquistou o primeiro lugar na categoria presunto cru do 1º Concurso Nacional da Qualidade de Cárneos, realizado em Guarapari (ES) durante o CONASIM 2025. O prêmio, anunciado em 14 de novembro, representa um marco importante para a produção artesanal de embutidos no Norte de Minas.

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Foto: Ugo Borges

O diferencial do produto premiado está na matéria-prima: a carne do porco do cerrado, desenvolvida pelo Núcleo de Estudos em Produção de Suínos da UFMG Montes Claros (NEPSUI). A raça resulta do cruzamento entre o macho Duroc e a fêmea Piau, combinando adaptação ao clima do cerrado e semiárido com qualidade excepcional da carne.

Segundo o professor Bruno Silva, coordenador do NEPSUI, o projeto iniciou há 12 anos com objetivos claros: “Desenvolver uma raça que pudesse se adaptar dentro de um contexto de clima cerrado e semiárido. Mas que também apresentasse características associadas como qualidade da carne, que permitisse melhores rendimentos”.

Características que fazem a diferença

O empresário Ugo Borges, proprietário da charcutaria e doutor em Ciências da Saúde, destaca as qualidades únicas da carne: “A carcaça tem uma conformação bem distinta. O animal desenvolve uma camada de gordura mais espessa e estável, que protege a peça durante a cura e garante uma perda de umidade lenta e contínua. Isso permite maturações longas de 18 e até 24 meses com segurança”.

Ugo Borges apresenta peça de pernil maturado de porco do cerrado.
Foto: Charcutaria Sagrada FamíliaFoto: Charcutaria Sagrada Família

Um elemento crucial é a dieta dos animais, que inclui castanha de baru na etapa final. O professor Bruno Silva explica que isso “agrega características adicionais como sabor, aroma” e melhora a qualidade da gordura. Para Borges, essa escolha reflete uma visão científica do bioma. “O cerrado oferece ingredientes e soluções que podem ser aplicados tanto na alimentação humana quanto animal”.

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Parceria entre universidade e mercado

O sucesso do presunto premiado é fruto de uma década de colaboração entre a academia e a produção artesanal. Borges iniciou os testes com curados de maturação longa em 2014, em uma região tradicionalmente conhecida por carne de sol e linguiças, mas sem histórico em produtos maturados.

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“Foi uma construção conjunta”, afirma o empresário. “Nós levamos resultados de campo, retornamos com percepções sensoriais. Eles trouxeram conhecimento técnico, revisaram dieta, ponto de abate, idade de abate e parâmetros de carcaça”.

Significado da conquista

Para o professor Bruno Silva, a premiação vai além do reconhecimento individual. “O prêmio vem coroar todo o trabalho desenvolvido pela UFMG, pelo NEPSUI, mostrando que a gente precisa associar, aliar ciência, tecnologia e o campo”.

A conquista também valoriza a preservação de raças nativas como o porco Piau e oferece alternativas de renda para a agricultura familiar. Com a crescente demanda por produtos de origem mais robusta no mercado, o trabalho desenvolvido em Montes Claros demonstra que é possível unir tradição, inovação científica e sustentabilidade regional para criar produtos de excelência reconhecida nacionalmente.

A avaliação no concurso foi realizada às cegas, ou seja, com júri especializado analisando estrutura, textura, aroma e sabor sem conhecer os produtores. O que torna a vitória ainda mais significativa para a charcutaria que está no mercado há cerca de 10 anos.