Setor rural, pilar das exportações argentinas, acompanha eleições como termômetro da agenda liberal do governo
Reprodução: InfoCampo/Argentina

Javier Milei chega às eleições legislativas deste domingo (26) em clima de tensão. O libertário, que fez do combate ao Estado sua bandeira, enfrenta nas urnas um teste decisivo: saber se o país aprova sua agenda econômica e se o Congresso permitirá que ela avance.

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Nenhum setor observa esse embate com tanta atenção quanto o agronegócio. A agricultura é responsável por mais de 60% das exportações argentinas e, em meio à recessão e à desvalorização de 54% do peso, tornou-se o principal fiador da geração de dólares.

Desde que assumiu, Milei tem se esforçado para reconstruir a relação com o campo, historicamente desconfiado do poder central. Em julho, durante a Exposição Rural de Palermo, ele discursou diante de milhares de produtores: “O que o campo precisa não é que o Estado o proteja, mas que o deixem trabalhar.”

A frase, registrada pelo jornal La Nación, foi recebida com aplausos e sintetizou o eixo de sua política: menos impostos, mais liberdade e câmbio unificado.

Redução de impostos, mas sem garantias

O presidente anunciou a redução das retenciones, tributos cobrados sobre exportações de grãos e carnes, medida vista como um gesto de reconciliação. Em discurso, prometeu que “a Argentina voltará a ser o celeiro do mundo”.

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A decisão foi elogiada, mas também relativizada. Segundo o Infobae, representantes da Sociedade Rural Argentina e da Federação Agrária advertiram que o governo ainda não detalhou quando a medida se tornará permanente. “Não está prevista uma queda estrutural das alíquotas”, escreveu o portal.

Um comunicado conjunto das principais entidades rurais reforçou o pedido de segurança jurídica: “Exigimos a eliminação definitiva desses impostos, de maneira previsível e sustentável”, afirmou o texto, reproduzido pela Reuters.

A reação reflete um dilema. Milei liberalizou o câmbio e retirou parte das restrições à exportação, mas precisa do novo Congresso eleito hoje para aprovar o avanço das reformas. Uma maioria hostil pode travar projetos-chave e forçar o governo a recuar.

Mercado observa

Investidores e analistas monitoram o pleito como um indicador da estabilidade futura. O mercado agrícola vê Milei como um aliado natural, mas a governabilidade ainda é incerta.

“Há entusiasmo, mas também cautela”, disse o economista Jorge Castro à Agrofy News. “Se as reformas não forem aprovadas, o país voltará à mesma armadilha fiscal que sufocou o agro nas últimas décadas.”

Em setembro, o presidente reagiu às críticas de que apenas grandes exportadoras se beneficiaram do corte temporário de impostos. “O melhor respeito é que o preço da soja subiu de 295 para 350 dólares”, afirmou à emissora A24, garantindo que “os produtores se beneficiaram diretamente”.

Efeito regional

Um agronegócio argentino mais competitivo poderá alterar o equilíbrio comercial da América do Sul. O país já sinaliza recuperação nas exportações de soja e milho, o que pressiona o Brasil e o Paraguai nos mercados asiáticos.

Ao mesmo tempo, o setor de máquinas agrícolas brasileiro enxerga oportunidade: com o fim das barreiras à importação de equipamentos, a Argentina pode ampliar compras de tecnologia e insumos produzidos no Brasil.

Expectativa no campo

Nas províncias agrícolas de Córdoba, Santa Fé e Entre Ríos, o clima é de esperança cautelosa. Produtores reconhecem que o discurso liberal de Milei trouxe alívio, mas esperam menos improviso e mais continuidade.

Javier Milei em evento da Expo Angus na Argentina

“O solo argentino é fértil, mas a política precisa parar de mudar o clima a cada eleição”, disse um dirigente rural ouvido pelo Clarín Rural.

As urnas fecham às 18h e os primeiros resultados devem sair à noite. Para Milei, o voto do campo pode definir não apenas o futuro do seu governo, mas o rumo econômico de um país que tenta, mais uma vez, se reinventar pela força da terra.